Você é uma pessoa equilibrada?
Vamos juntos: Quando você pensa na palavra equilíbrio, o que te vem imediatamente como pensamento ou imagem? Não leia ainda o que vem a seguir, pare e registre o que surge antes de prosseguir.
Para a maioria de nós o que surge de imediato são pensamentos ou imagens que invocam estabilidade, imobilismo, permanência no tempo, sem presença de oscilações e flutuações, que se mantém sempre igual, sem sobressaltos: se for uma paisagem tudo nela é perfeito, lindo e calmo — sem vento, o sol luminoso e agradável, temperatura agradável, natureza harmoniosa, tudo pacífico e ideal; se for um objeto, proporcional e simétrico, com cores nem berrantes, nem apagadas demais, sem arestas. Se for o rosto ou o corpo de uma pessoa, agradável aos olhos, simétrico, proporcional entre suas partes, nem chamativo demais, nem apagado demais; vestimentas nem rebuscadas, nem desleixadas. Quanto aos modos de ser de uma pessoa, consideramos equilibrada aquela que não se exalta, que tem um tom de voz praticamente inalterável, que não demonstra muito as emoções, que é ponderada e racional em suas atitudes frente a qualquer situação que se apresente, de preferência sem considerar seus sentimentos e emoções, ou pelo menos não demonstrá-los; são equilibradas aquelas pessoas sensatas, sempre ponderadas, que vivem a vida sem sobressaltos, sem dúvidas, sem demonstrar angústia ou exaltação, fieis aos valores caros a nossa sociedade, em conformidade com as regras e as normas vigentes — que parecem não se estressar, não ter conflitos que as deixem paralisadas ou sem respostas rápidas, eficazes e sábias.
Agora, a real: aprendendo com a fisiologia e com o que podemos observar em nosso corpo, não existe equilíbrio estático! Observando-nos honestamente em nossos humores, emoções, sentimentos, pensamentos, em nossas vibes, também temos que confessar que não. Mas naturalizamos a tal ponto a concepção de equilíbrio, que acabamos nos julgando e aos outros por ter flutuações, oscilações, por mudar de ideia, de valores, de opiniões, de não ter controle e palavra sobre tudo o tempo todo.
Lembro de me dar conta do preconceito do equilíbrio estático pela primeira vez aos 15 anos, durante uma viagem com meus pais e meus dois irmãos mais novos. Estávamos percorrendo alguns estados americanos e lá pelo quinto hotel em que ficamos, depois de nos quatro primeiros ter pedido panquecas no café da manhã, resolvi pedir outra coisa. Para minha surpresa, meus pais se espantaram e perguntaram por que eu não havia pedido panquecas! Já achei estranha essa pergunta, mas respondi. Não se dando por satisfeitos insistiram na questão, argumentando que eu "sempre" pedi panquecas e de repente mudei. Como se isso fosse uma incongruência, sem sentido, demonstrando alguma instabilidade interna minha.
Vamos olhar agora para um claro exemplo, observando o corpo, do que se trata realmente quando falamos em equilíbrio, sem jargões ou explicações fisiológicas, mas pela pura e simples vivência. E esse exemplo é extensível a todo nosso organismo e nossa vida psíquica.
Vamos lá. Fique em pé, sinta bem o apoio dos pés no chão, perceba seu corpo como um todo por um momento, sua respiração - foque-se nisso. Em seguida tire um pé do chão e procure se equilibrar só nele. Se não conseguir permanecer um pouco nesse equilíbrio, treine algumas vezes até conseguir. Daí perceba o que acontece quando consegue alguma permanência: você fica estático, como uma estátua? Não, nem nunca conseguirá chegar nisso. Por mais craque que você possa ser, sempre haverá no mínimo micro-movimentos para mantê-lo estável: a estabilidade do equilíbrio está sempre fundada na instabilidade, num certo "desequilíbrio". Perceba como seu tornozelo e seu pé estão sempre gerenciando o equilíbrio, com pequenos movimentos milimétricos de retificação para que a permanência possa ocorrer. O mesmo com seus braços e todo seu corpo, por mais treino que alguém tenha, como um bailarino ou um equilibrista, sempre serão visíveis esse reajustes constantes para manter o equilíbrio.
Em nossa vida psíquica não é diferente: em nossos comportamentos, emoções, sentimentos, simpatias e antipatias, opiniões, visões, valores, gostos e desgostos — desde que não sejam auto-destrutivos ou destrutivos para terceiros - são bem-vindas as flutuações e oscilações, as dúvidas, as mudanças de ponto de vista, a permissão para sentir as emoções e sentimentos que nos constituem como humanos, a permissão para ter conflitos, a permissão de não ter tudo sob o estrito "equilíbrio" (leia-se controle) que muitas vezes nos impomos. Nossas "vibes" não são sempre iguais nas mesmas situações, nem sempre as mesmas, num mesmo dia podemos entrar em sintonias diferentes, e isso não é algo ruim em si, a menos que seja desproporcional e impeditivo de viver sua vida cotidiana. Pelo contrário, nos escutar e perceber em cada situação qual é a "vibe", o que sentimos, que emoções estão presentes, nos perceber junto às pessoas, às coisas e às circunstâncias, sensíveis também a elas, é o que nos permite encontrar o melhor equilíbrio a cada vez, que é sempre diferente, porque é sempre dinâmico, está sempre buscando seus ajustes. E nem sempre será impecável, nem deve ser quando estamos realmente vivos. E muitas vezes passaremos por fases contorcidas, como na modelo da imagem no início do post, pois pendemos muito para um lado por necessidade, ou até por escolha, mas sem cair no chão.
Só o que morre é inerte. O equilíbrio vivo é fluido e dinâmico, sempre vindo-a-ser.